sexta-feira, julho 14, 2006

Pensamento do Ano


Há um velho provérbio árabe que diz:









Pense nisto!!!!

1 Comments:

Blogger &dré said...

Pensei em qualquer coisa sobre o assunto... Tratarei neste artigo da teoria lévi-straussiana da nomeação como classificação. É em La Pensée Sauvage (PS) que Lévi-Strauss elabora essa teoria, no contexto de uma reflexão mais vasta sobre os modos do pensamento selvagem.
Pensamento selvagem esse cujo objectivo não é necessariamente um fim prático, mas muito simplesmente a satisfação de um desejo de conhecer a natureza e a sociedade.
Esse desejo de conhecer é essencialmente classificatório. Procura, antes do mais, impor uma ordem porque «cada coisa sagrada deve estar no seu lugar» (Lévi-Strauss, 1962, p. 17), como precisava um «selvagem».
Existe no pensamento selvagem, como em todo o pensamento aliás, uma espécie de horror ao vazio, à indistinção que seria o caos. É pois preciso tudo distinguir, opondo, para bem classificar: «possuindo a classificação, qualquer que ela seja, uma virtude própria relativamente à ausência de classificação» (Lévi-Strauss, 1962, p. 16).
Tudo isto é manifesto nos sistemas de parentesco como nos ritos, pois que se trata sempre, num caso como no outro, de «não deixar escapar nenhum ser, objecto ou aspecto, a fim de lhe atribuir um lugar no seio de uma classe» (Lévi-Strauss, 1962, p. 17).
Deste ponto de vista, o pensamento selvagem é tão «acabado» como o pensamento científico que nós conhecemos, uma vez que este se funda também, finalmente, numa taxinomia1.
Há portanto, duas maneiras distintas de pensar cientificamente: uma, que é a nossa, muito conceptualizada, longe portanto do sensível, e a outra – o pensamento selvagem – bem mais próxima do concreto e da percepção sensível. É uma ciência do concreto que encontramos actuante no totemismo, tal como nos mitos ou nos sistemas de parentesco.
Poder-se-ia dizer que o pensamento selvagem «pensa com coisas» mas não com conceitos. Para explicar isso, Lévi-Strauss faz uma comparação, tornada célebre, entre o pensamento mítico e o bricolage.
Em ambos os casos, o sujeito opera com «os resíduos de construções e de destruições anteriores» (Lévi-Strauss, 1962, p. 27) e utiliza-os como instrumentos. É assim que as séries de objectos aparentados encontrados na natureza, ou em todo o caso, os termos que os designam, no caso do pensamento mítico, podem ser utilizados num outro contexto para seriar seres ou realidades sociais.
O mito, por exemplo, é todo ele um bricolage intelectual que opera com «resíduos» de uma linguagem primeira: leopardo, pássaro-mosca, gafanhoto, lagarto. etc. (cf. o mito de referência em Lévi-Strauss, 1964, pp. 43-45).
Não são, inteiramente, coisas, mas em todo o caso trata-se de qualquer coisa «a meio caminho entre perceptos e conceitos», quer dizer, com toda a evidência, signos que, tal como Saussure os definiu, possuem uma face sensível («imagem acústica», no caso da língua), o significante, e uma face puramente conceptual, o significado2.
O sentido procede da conjunção destes dois aspectos – o significante e o significado – no signo. E o signo, como o conceito, define-se também por uma propriedade que lhes é aliás comum: toma o lugar de algo diferente de si. Ou como dizia Peirce: «it stands for…».
A ciência opera pois com o conceito e o mito com o signo. Ambos subsistem em algo diferente deles – daí a sua operacionalidade –, mas há também uma diferença na medida em que o conceito tem uma muito maior capacidade de representação do que o signo.
O signo3 presente nos mitemas opera sobretudo num raciocínio por analogia e segundo uma certa retórica (de imagens) determinada pela natureza dos materiais que constituem o discurso mítico: procedentes de um outro sistema – a linguagem natural – que já os contém mesmo se como pedaços que se juntam e arranjam em diferentes combinações possíveis e à procura de um sentido: «o conceito surge assim como operador da abertura do conjunto com o qual se trabalha, a significação como operador da sua reorganização: não a aumenta nem a renova, e limita-se a obter o grupo das suas transformações» (PS, p. 30).
Estes signos, que são o material do bricoleur mítico, são restos de uma outra linguagem que, tal como os vidros partidos do caleidoscópio, se prestam a formar os mais variados arranjos que apreciamos simultaneamente como percepção estética e combinação lógica.
Importa sobretudo reter que estas lógicas concretas do pensamento selvagem se baseiam sempre em sistemas por vezes muito complexos de desvios diferenciais cuja forma circunstancial é bem mais importante do que o conteúdo, isto do ponto de vista de significação que se pretende exprimir, quer se trate das narrativas míticas ou do pensamento concreto que se exerce nas taxinomias (taxinomias que aliás reencontramos na base das narrativas, na própria lei que as engendra).
Trata-se portanto, para o pensamento selvagem, de construir um sistema, uma grelha, a partir das oposições/desvios diferenciais como, por exemplo, aquelas que na classificação bororo tripartida opõe e diferencia as plantas entre terrestres, aéreas e aquáticas.
Só a forma da grelha é importante, é ela que permite a sua utilização ao nível da narrativa mítica na sua sucessão diacrónica, decompondo-a, mesmo se isso implica uma simplificação da realidade empírica. Esta simplificação é exigida pela redução a grandezas discretas sem as quais não se pode construir um sistema de significação (Lévi-Strauss, 1964, p. 60).
Tal como em linguística, as grandezas discretas que são os fonemas (sem significação em si) produzem a significação pondo em relação precisamente através das distâncias diferenciais.
Do mesmo modo: «Os sistemas de denominação e classificação comummente chamados totémicos tiram o seu valor operatório do seu carácter formal: são códigos aptos a veicular mensagens transponíveis nos termos de outros códigos e a exprimir no seu sistema próprio as mensagens recebidas pelo canal dos códigos diferentes» (Lévi-Strauss, 1962, p. 101).
Continuando com o exemplo bororo, não é dito que a classificação tripartida é mais do que uma taxinomia vegetal, mas não seria estranho que se tratasse também de uma classificação totémica. Em qualquer dos casos, é assim que funciona o totemismo: as lianas (plantas aéreas) corresponderiam a um clã celeste, as jatoba a um clã terrestre e as plantas do pântano a um clã aquático.
Tudo isso se poderia reflectir também no plano da própria aldeia, tornando visível a grelha lógica da classificação projectada sobre o corpo social…
O totemismo não é portanto, no pensamento de Lévi-Strauss, uma espécie de religião mais primitiva, mas uma socio-lógica. Sócio-lógica que é aliás geradora da narrativa mítica (no eixo diacrónico).

5:34 da tarde  

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